Dra. Fernanda Mocelin

Uma mãe tem que saber o seu lugar

Estou sentada em uma cafeteria. Na minha frente, mãe e filha. A menina deve ter seus 16 anos e lixa as unhas. A mãe parece recém saída da capa da revista Caras e mexe no celular. Já faz 45 minutos e elas seguem assim.

Conversam monossílabos sem levantar os olhos. Eu não vi um sorriso trocado. Eu não vi o amor compartilhado. Falta claramente a intimidade e a leveza de um amor antigo e previsível.

A cena não é rara: a mãe parece mais adolescente que a filha. Rosto absolutamente esticado e excessivamente preenchido. A boca muito maior que a boca da menina. A mulher dever ter seus 45 anos e é sensual. Ela exala mais hormônios que a filha. A mãe faz vídeos no celular, é efusiva. A menina não aparece nos vídeos. A menina é peça decorativa.

Esta desconexão dói em mim. A filha parece invisível e ao mesmo tempo sufocada pela mãe. Ela olha pra mãe com vergonha. Esta mãe sorri para vídeos e fotos, mas nesta quase uma hora não foi capaz de arrancar um sorriso da filha. Um mísero sorriso.

É preconceito, eu sei, mas a aparência física, a linguagem corporal desta mãe e a completa falta de diálogo me fazem pensar que esta menina se sente sozinha. Porque não ter o olhar de mãe, no seu mais amplo sentido, é estar sozinha no mundo. É passar uma vida tentando preencher um buraco negro.

Vejo algumas mães de adolescente perderem o foco e assumirem o papel de amigas das filhas. Sempre achei que a grande sacada é ser confiável como uma amiga, mas não ser a amiga. Ser a MÃE. Porque ser mãe ninguém mais pode ser. Porque ser mãe é ser imensidão quando o mundo parece não ter mais espaço.

Saí do café pensativa, mas sabendo qual vai ser minha oração desta noite: “ Deus, por favor, me dê sabedoria para aceitar o meu envelhecer. E para ver o desabrochar das minhas filhas como quem vai ao teatro e sabe que não precisa estar no palco para se deliciar com a peça. Que eu saiba ficar nos bastidores, porque os bastidores são essenciais para que um grande espetáculo aconteça. E que o papel de coadjuvante não machuque meu ego.

Amém.


Dra. Fernanda Mocelin – Pneumopediatra – RQE 27.163